sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Viva os críticos!


“Obedeçam-lhes e façam tudo o que eles lhes dizem. Mas não façam o que eles fazem, pois não praticam o que pregam. Eles atam fardos pesados e os colocam sobre os ombros dos homens, mas eles mesmos não estão dispostos a levantar um só dedo para movê-los. Tudo o que fazem é para serem vistos pelos homens...”.
Mateus 23:3-5 (NVI) 

A sociedade, e principalmente os movimentos religiosos, pelo menos na grande maioria, historicamente se mostraram claramente contrários aos idealistas críticos, tendo como principal argumentação a dissociação do discurso com a prática apresentada pelos “críticos”. Contudo, há um erro histórico nesta aliena, pois se confunde e se iguala a crítica ao oposicionismo – termos essencialmente diferentes. Seria então ponderado distinguir os dois termos. Sendo assim, se pode nortear que a ação de criticar implica em transformar uma realidade que notoriamente esta errada, ou seja, criticar não é apenas argumentar, mas demonstrar na prática que é possível fazer diferente. De contra partida, o oposicionismo se norteia pelo belo discurso com palavras engenhosamente projetadas que visa contradizer um determinado pressuposto errôneo, porém não tem capacidade de transformar o discurso em prática, é apenas uma oposição.

A confusão dos dois termos se torna complexa para o entendimento, pois toda crítica invariavelmente será uma oposição. Contudo, a recíproca não é verdadeira, isto é, nem toda oposição é uma crítica. Portanto, o desafio é se munir de critérios bem definidos para que assim consiga distinguir uma crítica de uma mera oposição. Basicamente o que os distingue é que uma afeta as práticas – crítica, o outro se limita aos discursos – oposicionismo. Toda idéia, por mais correta e plausível que seja se não conseguir romper as barreiras filosóficas do discurso se torna automaticamente e axiomaticamente um oposicionismo, que, então, deve ser fortemente criticado. O fato de se contentar em apenas se opor a um pressuposto errado não torna o orador mais nobre que a falta observada, pois o que valida um discurso como relevante é a capacidade do mesmo de promover mudanças práticas, a começar pelo discursador.

De um modo geral as pessoas confundem falar mal de, com o ato de criticar – isto é oposicionismo. Deve ser por esta razão que alguém, não sei quando, provavelmente perdido na confusão dos termos, resolveu inventar uma designação dualística diferenciando a crítica como: crítica construtiva e crítica desconstrutiva. Não há duas maneiras de se criticar, a crítica quando de fato o é, sempre é construtiva, mesmo que provoque desconstrução. O que caracteriza uma crítica não é o estrago desta, mas sim a hombridade dos que a volta se comprometem a entender as causas, propor novos caminhos e a maestria de tornar a comunicação igualitária/solidária. O que costumeiramente se chama de crítica desconstrutiva é na verdade falácias de indivíduos orgulhosos que precisam humilhar outros para se destacar, estes são seres desprezíveis que se autojulgam superiores a partir da insegurança de suas próprias invejas, são pessoas que fazem de tudo para ter o aplauso das massas acreditando infantilmente nas instáveis ovações.

Perceba então, que o que chamamos de críticos literários, críticos de cinema, críticos gastronômicos e tantos outros na verdade são, na sua grande maioria – obviamente há exceções, apenas indivíduos oposicionistas. Analise a crítica que o personagem Anton Ego faz de si mesmo na animação Ratatouille (Pixar, 2007): “de certa forma, o trabalho de um crítico é fácil. Nos arriscamos pouco, e temos prazer em avaliar com superioridade os que nos submetem seu trabalho e reputação. Ganhamos fama com críticas negativas, que são divertidas de escrever e ler, mas a dura realidade que, nós críticos, devemos encarar, é que no quadro geral, a mais simples porcaria, talvez seja mais significativa do que a nossa crítica. Mas, há vezes em que um crítico arrisca, de fato, alguma coisa, como quando descobre e defende uma novidade. O mundo costuma ser hostil aos novos talentos, às novas criações. O novo precisa ser incentivado...”. O que fica notório nesta citação é o vislumbre de um oposicionista por profissão que começa a entender que criticar requer mais comprometimento, ousadia e sinceridade – virtudes estratosfericamente distante dos ser oposicionista.

O oposicionismo é mais prejudicial que a ausência de discursos. O oposicionismo é usado por aqueles que não querem mudar, mas apenas falar; não querem crescer, mas apenas confundir; não querem amadurecer, mas apenas estagnar; não querem ajudar, mas apenas atrapalhar. Por conseguinte, os oposicionistas são longos, porém rasos. Estes levantam os punhos em sinal de indignação, mas quando tem a oportunidade de provar ser possível fazer diferente simplesmente se omitem. O oposicionismo é um espetáculo de banalização da razão, pois não há nada mais vexatório que um discurso desassociado da prática. Como afirma Ferdinand Bac: “A oposição é um estado de privilégio. A partir dele pode bombardear-se o poder sem se saber nada, sem fazer nada e sem arriscar nada. Quando o incêndio deflagra, podemos instalar-nos nas bancadas da frente”.

O ato de criticar é uma atitude do pensar práxis. Quando se critica algo, isto implica em refletir, discursar e trabalhar para melhorar determinada situação. A crítica resulta de uma percepção do correto em contraposição ao errado, mas não se contenta em apontar, se dispõem a transformar. Criticar é apontar uma falha e ajudar a fazer o reparo; é perceber um abismo e construir uma ponte; é discursar sobre um caminho errôneo e conduzir outros por veredas retas. Num âmbito eclesiástico saudável a crítica é parte essencial do ser cristão, pois é por meio da crítica que se muda o status quo dos monarcas igrejeiros e assim torna a mensagem da cruz acessível para o maior número de pessoas. São estes cristãos críticos que não aceitam ver a igreja se ajoelhar perante a secularização, que não toleram a banalização do evangelho e nem admitem os líderes roubarem a glória de Deus. Estes críticos fazem coro com Paulo quando afirma: “Não importa o que aconteça, exerçam a sua cidadania de maneira digna do evangelho de Cristo, (...) permanecem firmes num só espírito, lutando unânimes pela fé evangélica” - Filipenses 1:27 (NVI).

Por tudo que foi exposto anteriormente fica notório que criticar não é fazer oposicionismo. Contudo, várias igrejas aproveitando da confusão em torno dos termos usam os púlpitos para apregoar um discurso maléfico a cristandade. Discurso este que afirma que o conceito de obediência é contrário, e completamente paradoxal, com a ação de criticar – o que obviamente não o é, pois obediência sem razão/pensar é apenas medo. Alguns líderes eclesiásticos se opõem aos críticos porque não querem perder a redoma confortável de falsas crenças que corrobora na dominical manipulação das massas evangelicais – quanto mais se depende do líder menos espaço para os da comunidade. Com estes terríveis pressupostos vários movimentos cristãos têm vivido como zumbis da fé, completamente irracionais no culto a Deus e plenamente ignorantes na vida cristã. Estes fiéis acríticos não percebem as heresias, as bizarrices, os abusos, a ganância dos lideres e as distorções bíblicas que descaradamente ocupam a mídia evangélica brasileira, pois foram ensinados (leia-se adestrados) que é “demoníaco” ser crítico/pensar – daí se opõem.

O autor John Stott escreve a história de um membro da igreja do Dr. Rufus M. Jones que demonstra o quanto os cristãos estão bitolados a viver um cristianismo sem críticas/pensar, o membro se queixa dizendo: “quando vou à igreja sinto-me como se tivesse desenrolando a minha cabeça e colocando por sob o assento, pois numa reunião religiosa não tenho necessidade alguma de usar o que se acha acima do meu colarinho” (retirado do livro Crer é Também Pensar, ABU, 1994, p. 19). A partir do momento que os cristãos entenderem que criticar não é fazer oposicionismo, e assim transformarem o discurso em prática, o mundo contemplará uma igreja viva, eficaz e coerente. Portanto, igreja é lugar de gente crítica. Logo, viva os críticos! 

Só uma observação final: critique sempre, critique inclusive e principalmente suas críticas....
 
Fortalecido pela cruz de Cristo, 
Vinicius Seabra | vinicius@mtn.org.br

Artigo escrito em: 12 de Outubro de 2009

sábado, 19 de janeiro de 2013

Por que queremos uma igreja grande?


“Afinal de contas, quem é Apolo? E quem é Paulo? Somos somente servidores de Deus, e foi por meio de nós que vocês creram no Senhor. Cada um de nós faz o trabalho que o Senhor lhe deu para fazer: Eu plantei, e Apolo regou a planta, mas foi Deus quem a fez crescer. De modo que não importa nem o que planta nem o que rega, mas sim Deus, que dá o crescimento”.
I Coríntios 3:5-7 (NTLH)

Ao início de cada ano quase sempre se desnuda sonhos de grandes projetos que por vezes caracterizam momentos de renovação de empolgantes desafios. No âmbito eclesiástico não é diferente, pois aos rumores de um novo ano logo se inicia uma saga para reafirmações de grandes ideais, mirabolantes planejamentos e apoteóticas estratégias de liderança. Entretanto, intencionalmente contrário à natureza do ser Igreja, porém sutilmente imperceptível aos olhos das massas da cristandade, vários recônditos evangélicos apresentam projetos anuais que se satisfazem exaustivamente e exclusivamente sob a premissa de fazer a minha igreja crescer numericamente – mesmo que tais postulados venham trajados com máscaras de amor, espiritualidade e incentivo. Portanto, se você não é um daqueles papagaios de piratas, mas estranhamente é um daqueles extintos seres que ousam pensar, então, já deve ter se perguntado: Por que queremos uma igreja grande?

O problema em questão não reside no fato de uma igreja ser grande, mas sim entender o porquê algumas igrejas pequenas se sentem tão erradas e inferiorizadas ao ponto de se venderem à corrupção, desviarem da Verdade e barganharem a salvação – tudo para ter o sucesso dos grandes – obviamente que nem todas as igrejas grandes encaixam nestas horrendas premissas. Ao que parece a lógica do capitalismo penetrou nos seios eclesiásticos brasileiros e fez dos cristãos seres insaciáveis, descomedidos, ambiciosos e apaixonados pela grandeza – contrariando ao ensino de Paulo (cf. Fp. 4:6-13). Então, para se atingir o objetivo, ter uma megaigreja, muitos demonizam o pecado para amedrontar as massas, supervalorizam as autoridades eclesiais para evitar questionamentos, mistificam o dízimo para financiar os caríssimos templos e criam mantras positivistas acerca da vitória para que o povo continue acreditando na Terra do Nunca. Portanto, é necessário que sejamos sinceros e questionemos nossas mais profundas intenções a fim de responder: Por que queremos uma igreja grande?

A resposta desta inquietante pergunta circunvizinha pelo menos dois questionamentos: 1) O ter uma igreja grande seria o fiel da balança para determinar quem está certo e quem está errado? Tal postulado revela uma perspectiva sombria de algumas lideranças que se rebelaram contra suas igrejas de origem e, então, pensam que se tiverem mais membros do que a antiga igreja isto demostrará que eles estavam certos e os outros errados – a reciproca é verdadeira – daí ambas as igrejas travam um duelo descomunal e brutal. Tristemente, estes megalomaníacos eclesiásticos que tentam se autoafirmar perante outros homens por meio da altivez dos templos só estão tentando compensar o orgulho ferido, o rancor abafado e saciar o desejo de vingança – premissas estas nada cristãs. O desejo de rotular uma igreja de errada pode esconder intenções frívolas de corações que precisam de arrependimento e perdão. Para estes que vivem a fé para fazer suas igrejas crescerem se esquecem de que o que define se uma igreja está certa ou errada não é a grandeza, mas sim a fidelidade bíblica, o discurso cristocêntrico e a amável fraternidade cristã.

Há ainda a necessidade de se questionar as intenções com outra pergunta preliminar: 2) O ter uma igreja grande é o que autenticará a espiritualidade dos cristãos como verdadeira ou falsa? O cristianismo bíblico sempre mostrou uma espiritualidade mais pessoal do que coletiva (cf. Mt. 6:1-18). Sendo assim, seria no mínimo estranho aceitar que os tupiniquins possam arbitrar um espiritrômetro capaz de mensurar, hierarquizar e autentificar a espiritualidade, ainda mais tendo como critério os metros quadrados de um edifício de igreja. O Carpinteiro nunca precisou de grandes construções para exalar espiritualidade, um monte distante da cidade ou um barco de pescador a beira do Mar da Galiléia era suficiente. Não é a grandeza do local de culto que determina a ação de Deus, mas sim a soberana vontade do supremo Criador, dono de tudo e Senhor de todos, quer sejam grandes ou pequenos. Os que gostam de medir espiritualidade quase sempre são apaixonados por megatemplos, pois estes tentam compensar a insolidez da sua fé com a solidez dos tijolos das construções. Estes esquecem que: “O Deus que fez o mundo e tudo que nele há, sendo Senhor do céu e da terra, não habita em templos feitos por mãos de homens” – At. 17:24.

Ao se fazer as duas perguntas nos parágrafos anteriores percebe-se que podem ter intenções pseudo-cristãs ao desejar uma igreja grande. Esta neurose pelo crescimento ainda engloba outros problemas, que são fortes mitos acerca de uma igreja grande, a saber: Ter uma igreja grande tornará os membros mais participativos e envolvidos no ministério. Se isto for verdade, então, temos um sério problema de caráter cristão, pois pessoas que se motivam por multidões não merecem credibilidade ministerial, além de serem volúveis. Contrariando o que o senso comum imagina, na maioria das megaigrejas o índice de espectadores é gigantesco, e é exatamente por isto que geralmente estas igrejas se assemelham a auditórios de teatros, pois muitos vão para assistir o “espetáculo do culto”, sendo que deveriam ir à igreja para prestar culto. A verdade é que as atividades ministeriais exercidas nos templos dominicais tendem a não seguir a taxa de crescimento numérico dos membros. Por exemplo, numa igreja com 30 membros uma equipe de louvor com dez pessoas é mais que suficiente; numa igreja com 100 membros os mesmos dez da equipe de louvor também são suficientes; numa igreja com 1000 membros aqueles mesmos dez ministros de louvor continuam suficientes – por isto que megaigrejas geram, naturalmente, espectadores, enquanto deveria gerar trabalhadores (cf. Lc. 10:2).

O outro mito é achar que uma grande igreja tem melhores condições de fazer mais pela sociedade. Tal premissa deveria ser verdade axiomática tendo em vista o número de pessoas envolvidas e os valores financeiros possíveis. Contudo, devido ao alto custo de se manter os mausoléus eclesiásticos que foram construídos e tendo em vista que é caríssimo satisfazer estes requintados cristãos igrejeiros, então, quase sempre as ações se restringem aos da igreja local – estes ainda poderiam argumentar: afinal, não deveríamos nos preocupar primeiro com os de dentro antes de nos preocuparmos com os de fora. Este discurso seria apropriado para um clube social, mas como Igreja fomos chamados a ir mesmo que, e preferencialmente que “nada leveis convosco para o caminho, nem bordões, nem alforje, nem pão, nem dinheiro; nem tenhais duas túnicas” – Lc. 9:3. A triste verdade é que algumas igrejas se tornaram uma vila exclusivista, com códigos próprios e reis postos, algo perigosamente semelhante ao proposto pelo filme “A Vila” (2004, distribuído por Buena Vista Pictures). Ah! Tem mais um detalhe, usar dinheiro do Governo para fazer obras sociais não ameniza a situação só atenua a ineficácia da igreja como Igreja.

Por que queremos uma igreja grande? Esta pergunta poderia se desdobrar em infindáveis páginas não para desmoralizar igrejas grandes, que por si só não configuram problema algum, mas para questionar o que estamos dispostos a fazer para termos e mantermos nossas igrejas grandes. Para tanto, é valido finalizar este artigo com o desabafo de Ariovaldo Ramos: “...Voltemos às orações e jejuns não como fruto de obrigação ou moeda de troca (...). Voltemos ao amor que agasalha no frio, assiste na dor, dessedenta na sofreguidão, alimenta na fome, que reparte, que não usa o pronome ‘meu’, mas o pronome ‘nosso’ (...). Voltemos a ser servos uns dos outros, aos dons do corpo que correm soltos e dão um tom litúrgico da reunião dos santos. Que o culto seja do povo, e não dos dirigentes! Chega de show! Chega de ministérios megalômanos, onde o povo de Deus é mão de obra ou massa de manobra! (...) Por que a pressão pelo crescimento? Jesus Cristo não ordenou ser uma igreja que cresce, mas um igreja que aparece: ‘assim resplandeça a vossa luz diante dos homens...’ – Mt. 5:16. Deixemos o crescimento para o Espírito Santos. (...) Voltemos à escola dos profetas que denunciam a injustiça e apresentam modelos de vida comunitária (...). Quero ser só cristão. Um cristão integral (...), que pratica a missão integral” (retirado do livro Nossa Igreja Brasileira, Hagnos, 2002, p. 21-23).

Fortalecido pela cruz de Cristo, 
Vinicius Seabra | vinicius@mtn.org.br

Artigo escrito em: 11 de Janeiro de 2011

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

O ministério da fofoca


“Se alguém se considera religioso, mas não refreia a sua língua, engana-se a si mesmo. Sua religião não tem valor algum! ...a língua é um fogo; é um mundo de iniqüidade. Colocada entre os membros do nosso corpo, contamina a pessoa por inteiro, incendeia todo o curso de sua vida ...a língua, porém, ninguém consegue domar. É um mal incontrolável, cheio de veneno mortífero”.
Tiago 1:26; 3:6-8 (NVI)
 


O “Ministério da Fofoca” é constituído por pessoas das mais diferentes faixas etárias, dos mais variados credos e das diversas classes sociais. Tristemente, estes também se encontram dentro das denominações evangélicas, onde fazem seus ninhos férteis. Então, o “diz-que-diz-que” tem sido a palavra de ordem no que tange a pseudo-espiritualidade de muitos santos contemporâneos. A doutrina do boato tem se tornado a vestimenta que disfarça a fragilidade de caráter do ser chamado humano. Numa projeção informal (sem nenhum comprovação!) se pode arrazoar que a cada cinco cristãos, três, são membros ativos do “Ministério da Fofoca”, e os outros dois são membros passivos. Para melhor entender como funciona esse ministério será apresentado abaixo uma cartilha explicativa (uma sátira/ironia, claro!) com informações do tipo: Quem somos? Quais requisitos para se ingressar? Como participar? Quais os objetivos? No que cremos? 

Quem somos? 
O “Ministério da Fofoca” é um grupo de pessoas que vivem a essência da palavra união, onde todos sabem, comentam, inventam e dão palpites sobre a vida de outros. São homens e mulheres de elevado grau de espiritualidade, podem até mesmo passar horas a fio trocando motivos para interceder pelo próximo. 

Quais os requisitos para se ingressar? 
Os requisitos para se tornar um membro do “Ministério da Fofoca” são: a) ter habilidade de comunicação; b) ser um jornal ambulante; c) ter acesso a várias reuniões secretas; d) ser um bom facilitador, disposto a colher várias opiniões, evitando assim a parcialidade; e) ser democrático a ponto de não tomar nenhuma decisão sem antes conversar com várias pessoas, que definitivamente, não possuem qualquer ligação com o caso em questão. 

Como participar? 
Para participar é bem simples, basta reunir com duas ou mais pessoas e começar a dar sugestões sobre o que os outros precisam melhorar. Sempre se coloque como superior aos demais, afinal, você é quase perfeito, mas não pode falar isto abertamente, pois as pessoas não entenderiam a sua grande humildade. 

Quais os objetivos? 
Os objetivos abordam: Ajudar as pessoas a serem mais comunicativas. Desenvolver a capacidade de imaginação, dando oportunidade para que todos, indiscriminadamente, forneçam palpites e suposições. Valorizar a criatividade humana em situações verídicas. Facilitar o processo de maturação da igreja, onde todos podem recomendar melhorias significativas na vida dos membros. Por fim, porém não menos importante, objetiva ser a verdade e a justiça dos fracos e oprimidos. 

No que cremos? 
Nós, membros do “Ministério da Fofoca”, cremos que a igreja é um ponto de encontro, portanto, todos têm liberdade de falar abertamente sobre tudo e principalmente sobre todos. Cremos no poder da oração, por isto, trocamos informações que na verdade são motivos de intercessão. Cremos na unidade, assim, não se pode admitir que todos não saibam de todos. Cremos na amizade, logo, compartilhamos os segredos de outros para não nos esquecermos.

Deixando a ironia de lado se faz necessário ponderar que neste mundo do “diz-que-diz-que” a verdade é sempre a primeira a morrer, o que sobra é somente mentiras. Infelizmente, o “Ministério da Fofoca” muitas das vezes vem disfarçado como um simples comentário, outras vezes como uma mera conversa amigável, algumas ocasiões vêm com a máscara de santidade, evitando assim escândalos. Por causa de tudo isto é válido afirmar que a igreja é lugar de vida, não de fuxico! Tristemente, o “Ministério da Fofoca” tem feito várias vítimas, pois na Eclésia pós-moderna as pessoas não são tão feridas pelo que acontece quanto o é pelas fofocas criadas entorno do que realmente aconteceu. 

Fortalecido pela cruz de Cristo, 
Vinicius Seabra | vinicius@mtn.org.br

Artigo escrito em: 07 de Outubro de 2004

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Cadê a humildade que estava aqui?



“Portanto, como povo escolhido de Deus, santo e amado, revistam-se de profunda compaixão, bondade, humildade, mansidão e paciência. Suportem-se uns aos outros e perdoem as queixas que tiverem uns contra os outros. Perdoem como o Senhor lhes perdoou. Acima de tudo, porém, revistam-se do amor, que é o elo perfeito. Que a paz de Cristo seja o juiz em seus corações, visto que vocês foram chamados a viver em paz, como membros de um só corpo. E sejam agradecidos”.
Colossenses 3:12-15 (NVI) 

Discorrer sobre humildade é sempre uma aventura. O problema inicial reside na essência filosófica do ser humilde. Perceba que quem é humilde não ousa ensinar sobre humildade, pois isto é conceitualmente contraditório. Então, quem é humilde não se preocupa em ser reconhecido como tal e tem profunda rejeição de serem rotulados com esta tamanha grandeza. Estes fazem isto não para serem vistos ou percebidos pelos que rodeiam, o fazem por simplesmente serem humildes. Portanto, aprender/ensinar sobre humildade é um desafio de projeções gigantescas, pois só de adjetivar alguém de humilde já se perde a essência do ser humilde. A situação agrava quando você pessoalmente olha para si mesmo e se juga como humilde, pois isto denuncia que tal característica não faz parte de seus atributos. Antagonicamente, os que não buscam reconhecimento se o fazem intencionalmente já se contradiz com a bendita busca da humildade, pois fazer algo para ser humilde é basicamente não ser humilde. O humilde não quer ser humilde, ele simplesmente o é. O humilde não faz nada para não aparecer, ele simplesmente não aparece. O humilde não contabiliza bondade, pois o faz naturalmente. O humilde não sabe que é humilde, pois ele é humilde.

O problema filosófico acerca da humildade destacado no paragrafo anterior dificuldade a continuidade da escrita deste artigo, pois se eu alcancei tamanha humildade ao ponto de ensinar sobre tal conceito isto desnuda que estou mui longe do que é ser humilde. Se contrariamente, reconheço que não sou humilde torna as linhas abaixo um ultraje desprezível até mesmo para os mais orgulhosos leitores, além de soar como um belo discurso farisaico. Ciente deste conflito eu seguirei a escrever sobre humildade não por tê-la como um de meus adjetivos, reconheço tamanha ausência – digo isto não para dar um tom de humildade neste texto, o faço por pura consciência de minhas desvirtudes. Contudo, seguirei nesta pensata sobre humildade como que tentando encontrar um lampejo de esperança acerca da transformação que o Evangelho pode fazer no interior de pecadores, que assim como eu, estão desafortunadamente necessitados de encontrar o Cristo que abale as bases do meu/nosso caráter. É ali aos pés da cruz que te convido a uma jornada de reflexão sobre perdas, fraternidade, amor, bondade, gratidão e perdão, ou se você preferir, substitua todos estes distintivos anteriores pelo termo “humildade”. É nesta busca que debruço meu orgulho, prepotência, maldade, arrogância e inveja. Se você é humilde o suficiente te convido a tolerar os próximos parágrafos. Se lhe falta humildade, então, te convido a uma jornada que, espero, encontremos a assombrosa Graça do Carpinteiro que insiste forjar humildade nos corações humanos. 

A humildade está na contramão da autossuficiência. O sentimento de autossuficiência surge da presunção de pensar ser mais do que o é, por isto Paulo adverte: “...digo a todos vocês: ninguém tenha de si mesmo um conceito mais elevado do que deve ter; mas, pelo contrário, tenha um conceito equilibrado...” Romanos 12:3 (NVI). Tristemente, não poucas vezes, a autossuficiência surge sorrateiramente a partir dos louvores dos outros que preferem impulsionar uns usando como combustível o elogio. Nada é mais corrosivo a humildade do que aplausos. Endossando esta premissa o compositor e cantor Valter Júnior, no álbum “Momentos e Canções” (1992), na canção “Pedro”, reflexiona: “Pensar ser forte foi o erro meu, apoiar-me em minhas próprias forças, desejei eu. Embasado em elogios, aplausos, qualidades, ilusão de quem é adulto, mas ainda não cresceu. Se eu me visse como o pó que sou fácil seria: O Mestre juntaria Sua saliva e, o milagre então, de milhares que o veria através de mim, se realizaria. Mas penso ser rocha e, ao fim, sou tropeço. Pedro também pensava assim. Pedro, Petros, Pedra. Puro engano. Pedro apenas pó (...)”. Por esta razão o Carpinteiro instruía alguns que após o milagre não dissesse nada aos outros (cf. Mt. 8:4; Mc. 1:44; Lc. 5:14).

A humildade requer renuncia sem retribuição. O anonimato é uma virtude dos humildes, que mesmo longe dos holofotes fazem mais que os astros que desfilam nos palanques da vida. No contexto de igreja isto também é válido de ponderação, pois, infelizmente, resumiram a fé em apenas dois ministérios, a saber: pregação e louvor – ambos ministérios enamoram existencialmente e indissociavelmente com as platéias. Contudo, ser Igreja é muito mais que discursar ou cantar, requer entrega, doação e abnegação – aqui se encontra todos os outros indispensáveis ministérios que fazem a igreja ser Igreja, e que subsistem por detrás das câmeras. Catastroficamente, muitos servem o Mestre com segundas intenções, quase sempre do gênero reconhecimento/retribuição. Estes confundem justiça de Deus com meritocracia, pois julgam que Deus tem que beneficiar os bons; confundem amar com tratar bem o próximo, pois afinal um dia pode-se precisar daquela pessoa. Confundem bondade com a lei da semeadura, estes fazem o bem não por caráter, mas por acreditar que num futuro terão a bondade retornável; confundem paciência com investimento, estes toleram o próximo não por causa do amor, mas pelo medo de perder aliados.

A humildade dispensa vestimentas de piedade. Às vezes, na jornada nos é fornecido um traje de piedade que vem pré-formatado com programas sociais. Ali, onde se estabeleceu um processo planejado de bondade todos ficam “iluminados” pela luz da humildade. Os pobres que recebem os donativos imediatamente olham para os abastados e deduzem que estes são humildes, pois se misturaram com os necessitados. Mas, ser piedoso na coletividade pode ser apenas um disfarce para acalmar os gritos da consciência que acusa acerca da injustiça social global – isto soa tipo Miss Universo com o previsível discurso pela “paz mundial”. Piedosos de verdade são aqueles que extrapolam os programas sociais e torna causa de vida a vulnerabilidade social, independente dos programas ou da coletividade. Entenda, humildade não vem em um kit de combate a pobreza com datas e horários a cumprir, não se pode ser humilde apenas por algumas horas ou dias previamente estipulados. Obviamente, que não estamos desmerecendo os esforços, porém não podemos confundir humildade/piedade com voluntariado. A piedade é uma característica cristã proveniente da Graça, como entoa o cantor Jesus Adrian Romeiro na canção “es por tu gracia” (álbum “El Aire de Tu Casa” – 2005): “Quando ninguém me vê, na intimidade. Onde não posso falar mais que a verdade. Onde não existem aparências. Onde meu coração está aberto. Ali sou sincero, ali minha aparência de piedade se vai. Ali é Tua graça que conta. Teu perdão é o que me sustenta para estar de pé. E não poderia continuar se não fosse revestido pela graça e justiça do Senhor (...) É por Tua graça e Teu perdão que podemos ser chamados de instrumentos do Teu amor (...)” – tradução livre.

Para finalizar este artigo valerei das palavras de Ricardo Gondim na celebre reflexão “Tributo ao humilde” – escrito em 05 de Abril de 2012, quando afirma: “Humildade e desejo de onipotência não combinam. Petulância não admite fragilidade, não reconhece limites, não aceita inadequações. O insolente nunca se dispõe imitar os passos de Jesus que, sendo Deus, não considerou apegar-se ao poder. Ele preferiu vulnerabilizar-se no amor (...) Humildade equivale a esvaziamento. O prepotente não consegue amar porque não sobra espaço em seu mundo. Só ama quem abre mão de controle e se deixa invadir pela companhia do outro. O humilde busca esse bem querer feito de renúncia. Ele sabe da impossibilidade de coerção e amor se misturarem. O pretensioso vive inflexível, impaciente e raivoso. Sua vontade deve prevalecer a qualquer custo. O humilde não se envergonha de recuar. Derrotas não representam para ele fracassos pessoais; insiste em não reprimir com violência. Sem se impor, o humilde não se vê esmagado pelas frustrações. O humilde é discretíssimo e elegante. Prefere esconder dos olhos o que as mãos fizerem. Nunca se acostuma com ovações. Assim, quando nutre o desejo de perseguir a humildade, ninguém percebe; e quando escreve, sabe que está longe de tê-la alcançado (...)”.

Por tudo isto, humildemente me despeço de você leitor, torcendo para que nós, em algum dia, sejamos surpreendido pelo Autor da Vida com a sentença: “...minha graça é suficiente para você, pois o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza”, e seguidamente concluir como Paulo: “...Portanto, eu me gloriarei ainda mais alegremente em minhas fraquezas, para que o poder de Cristo repouse em mim” –  2 Coríntios 12:9 (NVI).

Fortalecido pela cruz de Cristo,  
Vinicius Seabra | vinicius@mtn.org.br

Artigo escrito em: 02 de Janeiro de 2013