terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Natividade, por uma visão integradora


"A virgem ficará grávida e dará à luz um filho, e lhe chamarão Emanuel que significa ‘Deus conosco’ (...) e ela deu à luz o seu primogênito. Envolveu-o em panos e o colocou numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na hospedaria”.
Mateus 1:23 (NVI), Lucas 2:7 (NVI)

O nascimento de Jesus é celebrado pela sua importância soteriológica (i.e. salvífica). Naquele dia a humanidade descobriu o que significa “Deus amou o mundo de tal maneira” (cf. Jo. 3:16). De agora em diante teríamos um lugar para atracar nossas vidas. Este que nasceu levará sobre si mesmo nossas mais horrendas transgressões, Ele será “moído por causa das nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados” (cf. Is. 53:5). De agora em diante nossas almas poderiam descansar sob a justiça de Deus. A natividade trouxe mais que uma promessa futura de vida eterna, veio junto da sentença “não temas” (cf. Mt. 1:20). De agora em diante teríamos fé em dias de incertezas. O nascimento de Jesus trouxe Deus para perto de nós, não que Ele outrora estive inacessível, mas agora temos o Emanuel “Deus Conosco” (cf. Mt. 1:23). De agora em diante nunca mais estaríamos sozinhos. A natividade traz consigo todas estas dádivas, é Graça para gente sem graça.

O nascimento de Jesus também descortina outras visões redentoras, como por exemplo, a proposta de nascer numa manjedoura. Ao contrário do que encenamos como algo ruim e depreciativo, o fato de Cristo ter nascido entre os animais foi majestoso. O Deus encarnado escolheu vir ao mundo junto da criação, não apenas dos homens. Ele escolheu nascer num lugar democrático, onde animais e homens celebrassem o Redentor, pois “toda a criação geme” (cf. Rm. 8:22), então, “Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo” (cf. II Co. 5:19). O fato de não haver lugar na hospedaria não fora um golpe do destino nos planos de Deus, muito pelo contrário, era a intenção de Deus, demostrando que a criação precisa reconectar-se. Ali, animais e homens entenderiam que “tudo quanto tem fôlego louve ao Senhor” (cf. Sl. 150:6). Não tinha lugar mais adequado para Ele nascer, a estrebaria seria o símbolo da nossa missão integral.

O nascimento de Jesus continua a fornece uma nova cosmovisão acerca do caráter de Deus e sua relevância integradora para nossas jornadas cristãs. Sendo assim, o Rei escolheu nascer junto à plebe revelando que a grandiosidade do Reino nada tem haver com privilégios exclusivistas exibicionistas. O Grande Eu Sou escolheu vir junto dos camponeses para que entendêssemos que “quem quiser tornar-se importante deverá ser servo” (cf. Mc. 10:43). Neste Reino do Emanuel não haverá lugar para diferenciação de classes sociais, somos uma irmandade. Não pode haver maiores. Não pode haver títulos. Não pode haver privilegiados. Não pode haver acumulo de riqueza. Não pode haver necessitados. Não pode haver desigualdade. O Rei deu-nos o exemplo a ser seguido e assim “olhando para Jesus, autor e consumador da fé” (cf. Hb. 12:2) podemos redescobrir nossa missão junto aos desafortunados, demonstrando que a Graça não é apenas um discurso natalino, mas é o marco regulador da nossa fé.

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 24 de Dezembro de 2013

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

A relevância de nossos cultos irrelevantes


“Portanto, irmãos, rogo-lhes pelas misericórdias de Deus que se ofereçam em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus; este é o culto racional de vocês”.
Romanos 12:1 (NVI)

O culto dominical em solos tupiniquins a muito já deixou de ter sua “relevância”. O que se percebe é um grande espetáculo de desorientação doutrinária, litúrgica e teológica. As músicas não agregam valores cristãos, mas sim uma luta individualista por vitória. Os momentos dos avisos não mais informam sobre as programações eclesiásticas, apenas exibem pessoas recheadas de improvisos. O sagrado momento das ofertas/dízimos não mais se dá a partir da gratidão, mas desnuda nossa mais vil forma de manipulação. As pregações que outrora chamávamos de sermões pelo seu valor doutrinário, agora se rebaixam ao nível vexatório de algo próximo a auto-ajuda. A leitura bíblica que abalizava nossa fé, hoje serve apenas como textos aleatórios para abrir e encerrar cultos. O prelúdio e poslúdio que eram momentos de profunda reflexão pessoal sobre a vida cristã perderam espaço para o lúdico, afinal, culto não mais é um lugar de reflexão, mas agora é apenas de celebração.

O cenário caótico de nossos cultos dominicais brasileiros nos faz questionar a real relevância de nossos aglomerados semanais. Até mesmo no mais zeloso dos ambientes protestantes percebe-se uma gradativa mutação entre o que é certo pelo o que se está dando certo. Até mesmo os mais coerentes pregadores percebem uma crise didática entre o que se ensina e a capacidade de absorção/aplicação aos ouvintes. Até mesmo nas ditas igrejas históricas que tinham como identidade litúrgica uma organização exemplar, que apresentavam lógica cerimonial, tem que admitir que nos tornamos algo tipo Jornal Nacional, ou seja, um monte de notícias que não tem nenhum nexo entre si – informando de tudo, mas não esclarecendo nada. Por isto, não seria exagero afirmar que o caos não está apenas nas igrejas neopentecostais, o vírus contaminou toda a irmandade evangelical tupiniquim, obviamente que alguns apresentam os sintomas de forma mais aguda, outros conseguem camuflar e, talvez, até minimizar o impacto viral na congregação.

Daqui, em meio ao lamaçal gospel, nós poderíamos chegar a triste conclusão de que o culto não mais ensina, não tem sentido, é uma perda de tempo. Talvez! Contudo, proponho nas linhas que se seguirão uma nova percepção sobre o nossos cultos irrelevantes. Para tanto, proponho que voltemos nossos olhares para fora da igreja e pensemos por um tempo sobre a relevância do ensino secular na nossa formação. Tente lembrar-se de conceitos do ensino fundamental e do ensino médio – não me refiro a momentos ou integrações sociais. Tente lembrar-se dos ensinos da gramática que a professora de português tanto se esforçou para ensinar. Tente lembrar-se do cálculo da tal tartaruga que sempre aparecia nas provas de física para se calcular a velocidade. Tente lembrar-se da tabela periódica da química. Tente lembrar as fórmulas enigmáticas da matemática. Tente lembrar-se dos conceitos empenhados para a alfabetização. Enfim, tente lembrar-se, conceitualmente, do que você aprendeu nos seus primeiros dez anos de vida escolar. Arrisco dizer que pouco ou nada nos vem à mente em termos conceituais. Por esta razão, muitos julgam a escolarização uma perda de tempo com pouca relevância para a vida adulta.

O fato de não nos lembrarmos dos conceitos do ensino médio não os tornam irrelevantes, pois por mais que não nos lembremos de quase nada daquela época estes foram anos importantíssimos para a formação intelectual que viria posteriormente. As bases do pensamento se sedimentaram a partir daqueles ensinos que hoje nem lembramos. A capacidade de raciocínio se deu a partir daquelas reflexões que hoje nem sabemos quais eram. A lógica interpretativa se impulsionou com aqueles textos aparentemente infantis que hoje desprezamos. As fórmulas e teorias que hoje questionamos sua funcionalidade formaram nossa visão holística/interdisciplinar sobre o mundo. Enfim, não podemos avaliar nossa jornada acadêmica pelo hoje sem reverenciarmos o passado irrelevante que tivemos. O caos de se estudar várias disciplinas desconectadas entre si não foi desorientação acadêmica, foram relances que fomentaram uma cosmovisão multidisciplinar. Não lembrar-se de algum conceito não quer dizer que não aprendemos sobre, pois este permanece em nosso subconsciente e de lá vai dando relevância para nossos conceitos contemporâneos.

A igreja e a escola se parecem muito. Ambas vivem recebendo críticas sobre sua relevância. E, como fora exposto, há muita irrelevância na historicidade de cada uma. Contudo, estas irrelevâncias não as tornam desnecessárias. Não podemos cometer o celebre erro de julgar ações coletivas a partir de critérios individuais. O que é desprezível para um, pode ser essencial para outro; o que se apresenta como um imenso erro na visão de um, pode ser o lampejo de maturidade para outro; o que se caracteriza como uma grande perda de tempo para um, pode ser o mastro de esperança para outro; o que alguém poderia julgar como uma atitude infantil, pode ser o elo integrador para outro; o que alguém poderia avaliar como irrelevante, pode ser a única coisa relevante para o outro. Por fim, temos que admitir nossa incoerência histórica que descortina nossa incapacidade avaliativa dos fatos e tempos. Há muita irrelevância em nossos cultos, mas fico a pensar, se fizéssemos uma mutilação e cortássemos os tais “tumores”, o que nos restaria? Não podemos esquecer que a obra de Deus não é feita por causa da nossa altiva relevância. Que possamos redescobrir a relevância de nossos cultos irrelevantes, pois como afirmava Clarice Lispector: “até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro”.

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 18 de Dezembro de 2013

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Jesus, o salvador de pecadores


“Ao ver as multidões, teve compaixão delas, porque estavam aflitas e desamparadas, como ovelhas sem pastor”.
Mateus 9:36 (NVI)

Jesus se fez homem, assumindo a humilhação da forma humana, desnudando-se da majestade, a fim de tornar-se o sacrífico único, perfeito e suficiente. Ele personificou o amor entregando-se voluntariamente aos seus algozes sabendo que a cruz não era o fim, mas apenas o grande palco do maior espetáculo que a humanidade já conheceu – o espetáculo da Graça. Ele se entregou assumindo a misericórdia como essência do Seu próprio caráter, sabendo desde a eternidade que os pecadores precisam encontrar o caminho do perdão – o caminho do recomeço. Ele popularizou a compaixão pelos excluídos sabendo que o céu não é o prêmio dos perfeitos, mas sim o lugar daqueles que reconhecem a pecaminosidade durante a existência – reconhecem o arrependimento. O grande Rei, que se tornou plebeu e deu-se a conhecer para os mais vis do Reino, os homens, com o propósito de resgatar o que havia se perdido.

Ao andar com pecadores o Carpinteiro desnudou a fragilidade da existência humana. Descortinou quem somos. Tornou visível o quanto tememos a ausência de fé, mesmo caminhando com Ele; O quanto nos assombra as incertezas sobre o futuro, mesmo assumindo ser discípulo do Mestre; O quanto a dor da exclusão é intensa, mesmo após o convite para descansar sob o pastoreio dEle. Por isto, mostrou que para os “pedros” sempre haverá uma segunda chance, mesmo que O tenha negado. Expos que para os “judas” sempre haverá um lugar entre os discípulos, mesmo que no fim O traia. Tornou público que para os “tomés” sempre haverá um tempo para descobrir o impossível, mesmo que precise toca-lO. O Deus sem pecado se fez pecado por nós, apontando o caminho sobre modo excelente, e então, vislumbramos a Graça que inunda nossas fraquezas.

O Reino está inaugurado. Os céus estão abertos para celebrar o ingresso daqueles que outrora marchavam para o inferno. A cruz se tornou uma luz que resplandece sobre as trevas. A crucificação selou para eternidade a vitória do amor em justiça. O Gólgota presenciou a superioridade da misericórdia. No madeiro ficou cravado o escrito de dívida da humanidade. Do monte da caveira jorrou a vida eterna. No Calvário foi pavimentado o caminho para a eternidade junto ao Pai. Enfim, está consumado. O caminho, a verdade e a vida estão acessíveis. A dor agora é momentânea, o sofrimento um breve instante, as tristezas pequenas têmporas e o choro apenas uma noite. De contra partida, a alegria é eterna, a paz sobrepassa o entendido, a gratidão é impagável e o amor interminável. O Reino é chegado e o Seu reinado nunca terá fim.

A contemplação do Crucificado é o ponto de partida da imitação de Jesus. É a elevação da experiência do sofrimento a valor de obediência à vontade do Pai. A imitação não é apenas da luta histórica de Jesus, mas e a celebração da presença de Deus. A imitação não é apenas a confissão da encarnação histórica e da morte pascal de Jesus. Esta confissão torna-se modelo e padrão a ser imitado. A forma como Jesus viveu a paixão da morte é transformada da esfera do anuncio para tornar-se um exemplo apropriado de vida. A motivação e a atitude que cercaram a vida e a paixão devem fazer-se presentes, igualmente, em nossa imitação dEle. O Autor da Vida nos instrui a buscar nossa motivação na Via Dolorosa. O modelo do Carpinteiro baseia-se na obediência e a perseverança.

Aos céticos, que por não terem vivido junto ao Cordeiro, desacreditam, escolhendo limitar suas existências as migalhas de histórias de sucesso terreno. A estes, o Carpinteiro lampeja esperança ao afirmar que Ele voltará. Não tardará, quando tudo estiver pronto, no tempo oportuno, Ele regressará. Conduzirá os Seus para a eternidade, onde não haverá mais desesperança; onde as dúvidas existenciais serão suprimidas pelo grande Eu Sou; onde a maldade não germinará; e, onde descansaremos nossas almas peregrinas. O retorno do Rei está próximo, isto não é medido pela vão ilusão de tempo gregoriano a que estamos submersos, o retorno triunfante é certo pelo fato de Ele ter prometido. E um de Seus atributos é ser fiel no que prometeu. Cada dia que passa não fragiliza esta promessa, pelo contrario, é Ele nos concedendo mais um dia de oportunidades para entalharmos a Graça nos corações de pecadores.

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 08 de Dezembro de 2013

sábado, 7 de dezembro de 2013

Carta escrita nos corações


“Vocês mesmos são a nossa carta, escrita em nosso coração, conhecida e lida por todos”.
2 Coríntios 3:2 (NVI)

O apóstolo Paulo ao escrever sua segunda carta a igreja de Corinto nos traz a memória os desafios do cristianismo contemporâneo. No qual a cada passo tem sido corrompido em um cartel eclesiástico.

No primeiro versículo do capítulo três de II Coríntios, Paulo diz: “começamos, porventura, outra vez a recomendar-nos a nós mesmos? Ou temos necessidade, como alguns, de cartas de recomendação para vós outros ou de vós?”. Os estudiosos dizem que Paulo disse isto, pois havia alguns mestres visitando Corinto, levando tais cartas, talvez escritas pelos presbíteros de Jerusalém.

Paulo argumenta que o fato dos mestres terem tais documentos (cartas) não garantia a verdade do ensino. Sugerem então que o melhor meio de se avaliar um mestre e/ou ministério é analisando os frutos produzidos pelo mesmo.

Nos versículos dois e três revela a verdadeira carta que todos deveriam ter estampada: “vós sois a nossa carta, escrita em nosso coração, conhecida e lida por todos os homens, estando já manifestos como carta de Cristo, produzida pelo nosso ministério, escrita não com tinta, mas pelo Espírito do Deus vivente, não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, isto é, nos corações”.

Cada cristão é uma carta ambulante. O que se lê é o reflexo do ensino que se prega. Contra este documento não a borracha que possa apagar. O que fazemos transmite com exatidão o que somos.

Ao ler estes primeiros versículos do capítulo três de II Coríntios pode até parecer, para alguns desapercebidos, que Paulo estava com orgulho. Todavia, prevenindo-se ele diz nos versículos quatro e cinco: “E é por intermédio de Cristo que temos tal confiança em Deus; não que, por nós mesmos, sejamos capazes de pensar alguma coisa, como se partisse de nós; pelo contrário, a nossa suficiência vem de Deus”.

Quando entendemos que a carta que foi escrita em nossos corações é obra das mãos do Criador podemos descansar, pois Ele é o Poeta maior. As melhores estrofes e rimas são frutos de Seu amor eterno para com a humanidade.

A carta que é escrita em papel comum com o tempo se desfalece, pode ser adulterada e pode conter inverdades. Entretanto, a carta que é escrita nos corações revela o chamado para o qual nascemos.

Cada carta escrita nos corações revela o que realmente se é.

E isto, todos lêem...

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 15 de Agosto de 2004