Judas 1:3 (NVI)
Nota explicativa,
antes da escrita (e leitura) da carta. A proposta de “cartas aos ex-membros de
minha igreja” segue a linha exposta em outro texto anterior a este (“cartas a
minha ex-igreja”) que, semelhantemente, faz-se necessário compreender o
destinatário, propósito e circunstancias a derredor desta. A primeira
observação necessária a ser feita é, novamente, reiterar que a utilização do
pronome possessivo “minha” nesta carta, também, não se refere à possessão, mas
denota afetividade. A segunda consideração refere-se à necessidade de
identificação de qual igreja me referendarei, a saber: Comunidade da Fé –
Igreja Cristã (Goiânia, Goiás, Brasil), igreja que atualmente pastoreio. E por
fim, reitero que a utilização da expressão “cartas” no plural não significa que
existem ou existirão outras cartas (pelo menos não na forma convencional da
escrita), mas denota os ecos advindos desta correspondência que, igualmente, jamais
conseguiria ser, por definição, uma só carta.
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A/C
Aos ex-membros da
Comunidade da Fé – Igreja Cristã.
Caros ex-membros
da Comunidade da Fé – Igreja Cristã (COFE). Não tenho muita certeza se esta
carta chegará a vocês, mas faço votos sinceros que chegue e que tenham
paciência para ler as linhas que seguirão. Reconheço que me sinto
desconfortável na escrita desta, pois englobarei num pacote só vários tipos de
pessoas e várias situações distintas. Então, me sinto receoso de ser mal
interpretado por ocasião das generalizações que aqui farei. Contudo, não
acredito que seja prudente desdobrar particularidades, isto não edificaria o
Reino, nem a nós mesmos. Portanto, a mim resta valer das palavras como pontes
para aprendermos com o passado.
Fui dar uma bisbilhotada nas listas antigas e na
atual lista de membros/frequentadores da Comunidade da Fé (COFE) e tive a
estranha certeza que apesar de poucos anos de igreja (2007-2014) já estamos no
rol das igrejas que mais tem ex-membros do que membros. Tive, então, a
curiosidade, apesar do receio, de ficar alguns instantes lembrando de cada
pessoa. Reconheço que esta foi uma sensação estranha (no mínimo constrangedora
e sufocante), pois pude perceber que a ausência destes (ex)membros deixaram
vazios gigantescos em minha vida e na história da COFE. Vocês deixaram buracos de
proporções estratosféricas, provando mais uma vez que pessoas são sim insubstituíveis.
Ao pausar por
alguns instantes, e relembrar de cada um de vocês que congregaram na COFE, me
fez chegar a dois lugares distintos e antagônicos (simultaneamente). Primeiro
percebi que alguns não mais estão na COFE, pois suas histórias superaram a COFE
e, então, devido a nossa pequenez histórica não foi possível suportar a estes. São gente que
precisavam de mais “espaço” para continuar a crescer e, talvez, a COFE fossem
um limitador (pelo menos naquele momento histórico). A estes fica meu lamento e
meu pesar consentimento, pois a grandeza destes (sem nenhuma ironia no termo) poderiam
ter feito a COFE ser uma igreja melhor hoje. As ausências de vocês não somaram
a nossa coletividade, pelo contrário, perdemos muito. Perdemos amigos,
histórias e lembranças.
O outro lugar que
cheguei (ou fui levado até lá) ao rever as listas de ex-membros, foi à dura
percepção de que há muitos ex-membros da COFE que não mais estão em igrejas
evangélicas (e em nenhum movimento religioso). Esta foi uma releitura que
mereceu rigorosa autocrítica. Saber que alguns de vocês não mais estão conosco por
terem alavancado voo superior a COFE é uma graciosa sensação de “abandono” (o
primeiro lugar), mas saber que alguns de vocês não mais estão por terem largado
a fé (o segundo lugar a que me refiro), é uma sensação de profunda perturbação
pessoal-pastoral. E aqui me fez indagar que tipo de evangelho nós da COFE
apresentamos a vocês, ou/e o que aconteceu entre nós que não foi
suficientemente cristão ao ponto de desabonar a fé, e/ou ainda, se será que nós
da COFE não conseguimos ser igreja para vocês de forma real. Estas indagações me
preocupam sobremodo, mas as possíveis respostas destas questões me põem em
crise didático-religiosa.
A crise
didático-religiosa a que me refiro se dá por não conceber a idéia de
deliberadamente transferir a culpa para vocês. Prefiro passar a reflexão
culposa primeiramente por mim. Faço isto não por achar que eu sou importante no
processo, mas como (ex)pastor de vocês acredito que seja minha responsabilidade
criticar minha forma de pastoreio. Também perpasso a reflexão culposa por mim
não para me vitimizar no processo, porém julgo relevante gastar um tempo para
avaliar minhas (nossas) desventuras. A minha crise didático-religiosa se
refere, essencialmente, a criticar o “modelo de ensino” da COFE (inclui-se:
estudo bíblico, liturgia, culto, confraternizações, grupos familiares...) – e
como sou o pastor não me resta para onde fugir.
É preciso
reconhecer que, talvez, o “modelo de ensino” da COFE tenha sido (e talvez
esteja sendo) muito insuficiente para vocês – fraquinho, superficial, distante
da realidade local. Se este for o caso, só me resta admitir que tenho (temos) minhas
(nossas) limitações. Contudo, sei que tanto eu, quanto os demais membros,
sempre tentamos fazer o melhor possível, mesmo sabendo que existe uma diferença
monumental entre fazer o melhor e ser o melhor – e ainda, admitir que fazer o melhor, às vezes, não é
suficiente. Ainda temos muito a aprender, crescer e amadurecer, estamos no
processo. Espero que tais deficiências (limitações) não sejam cristalizadas em
suas mentes e corações. Reconheço que existem muitas igrejas melhor que a COFE,
espero que vocês as encontrem e resignifiquem a fé de vocês.
Ao longo dos anos
aprendi uma verdade inquietadora: ninguém muda de igreja por acaso; ninguém se
desliga de um grupo religioso sem razão; ninguém sai de uma igreja
despretensiosamente. E sempre que alguém sai (inclusive os chatos e os inúteis)
o grupo perde. O bom da igreja é esta diversidade incontrolável (que, às vezes,
faz expelir pessoas – mudar de igreja ou abandonar a igreja). Podemos até
escolher onde congregar, não se pode escolher com quem vamos congregar. A todos
vocês que são ex-membros da COFE fica registrado minha profunda gratidão e
inquietação pelo tempo que congregamos juntos. Perdoe minhas (nossas)
limitações e infantilidades, e quem sabe um dia poderemos caminhar juntos outra
vez (isto seria fabuloso). Todos vocês deixaram marcar inesquecíveis em minha
vida e na história da Comunidade da Fé – Igreja Cristã. Lamento por não mais
estarmos juntos, mas agradeço por termos um dia estado juntos.
Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 03 de Outubro de 2014
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