quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Da diferença entre falar em público e pregar


“Pois dele, por ele e para ele são todas as coisas. A ele seja a glória para sempre!”
Romanos 11:36 (NVI) 

É preciso distinguir entre música e louvor (vide artigo “da diferença entre música e louvor”, do mesmo autor), então, igualmente é imprescindível que se diferencie o falar em público e o pregar. Obviamente que em ambos os casos boa parte da teoria, especialmente no que tange a oratória e retórica, são mui congruentes e convergentes. Entretanto, o objetivo final de ambas ações são estratosfericamente distantes e por vezes opostos entre si. Ao falar em público espera-se que o que discursa seja capaz de persuadir os ouvintes a algo, e isto se dá pela capacidade individual deste de ser articulado com as palavras, convincente quanto às pressuposições conceituais e carismático junto à plateia. De contra partida, mesmo reconhecendo que as alíneas anteriores são importantes, há algo mais importante: que o pregador seja fiel à Palavra, expondo as Escrituras com simplicidade, humildade e com profundo temor ao Senhor, ainda que isto não venha regado de eloquência ou retórica.

Pregar é falar em público, mas nem todo falar em público é uma exposição bíblica, isto é óbvio. Então, é igualmente óbvio que se atente sobre as características elementares de cada uma destas ações para não confundir os “palcos” e valer-se de pressupostos errados, emporcalhando a mensagem, tornando-a assim impropria. Quando se fala em público a indumentária e a postura do que discursa tem extrema importância no processo de convencimento, mas, de contra partida, na exposição das Escrituras a figura do mensageiro é o menor detalhe, o que importa é a grandiosidade da mensagem, que não depende da beleza estética do mensageiro. Num púlpito a mensagem supera as qualidades e deformidades do mensageiro. A Boa Notícia é completa em si e não precisa de retoques estilizados daqueles que a profere. Alias, é preferível que o pregador/mensageiro não roube a cena, mas saiba elevar os holofotes para A Única Mensagem. O pregador é um coadjuvante, não o ator principal.

Falar em público requer uma boa performance individual, pregar, por mais que aparentemente seja uma só pessoa a discursar no microfone, é no entanto, na verdade, uma ação coletiva de culto e devoção a Deus. A pregação implica em uma continuidade do culto público que se está fazendo, por isto não é um momento solo, desassociado das etapas anteriores e posteriores da liturgia. Por esta mesma razão o púlpito não deve ser monopolizado por apenas uma pessoa, domingo após domingo. A pregação é parte da igreja e, então, deve ser partilhada pela igreja. Púlpito não é lugar para se destacar, mas para continuar a cultuar; não é lugar para performance, mas sim pra servir; não é lugar para ostentação, mas para contrição; não é lugar para aplaudir, mas para se ajoelhar; não é lugar para ver os outros, mas sim para ajudar os outros.

Quando se confundi falar em público com pregar, três coisas acontecem: 1) pregadores (pastores) são venerados – expressões como “este é homem de Deus” são formas sutis de admiração exagerada que incha o ego do pregador, mesmo que despretensiosamente. Pregadores não deveriam ser elogiados por suas pregações, pois é o elogio o principal agente corrosivo da humildade, humildade esta elementar para ser pregador; 2) preocupa-se mais com a embalagem da mensagem do que com o conteúdo – quando começa-se a medir uma pregação pela quantidade de “glórias a Deus” que se escuta da plateia, ou quando começa-se a medir um pregador pelo reboliço que ele traz para a igreja, então, estes pregadores se esquecem que pregação não tem muito haver com popularidade, estratégia ou carisma, mas tem haver, única e exclusivamente, com a manutenção da glória de Deus [que é o conteúdo supremo]; e, 3) elitiza-se o púlpito – no contexto tupiniquim isto é evidente ao ponto de em quase todos os domingos do ano só se vê as mesmas figurinhas nos púlpitos, domingo após domingo. Isto acontece, pois há quem pense, erradamente, que pregação (e louvor) é para os bons.

Pregar é muito mais que falar em público, é parte intrínseca do ser Igreja. Pregação não é para pouco, mas deveria sim ser algo, naturalmente, partilhado por todos aqueles que integram a comunidade. Pregar é ensinar a Palavra, é compartilhar do Reino, é dialogar acerca da fé, é conversar sobre Aquele que mudou nossas vidas. Portanto, insisto, a pregação precisa ser popularizada e assim fugir aos rótulos do falar em público. Quanto mais a igreja coloca a pregação no campo do falar em público, mas distante se torna A mensagem do Carpinteiro, que preferiu discursar em meio às pessoas, com coisas simples, por meio de gente simples (discípulos) e finalizou o ministério terreno convocando: “ide, pregai o Evangelho...” Mc 16:15. Por conseguinte, mesmo que não saiba falar em público, é preciso que se pregue.

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 29 de Dezembro de 2015

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