quinta-feira, 25 de junho de 2015

Brasil, a Roma dos evangélicos


"Tenham cuidado para que ninguém os escravize a filosofias vãs e enganosas, que se fundamentam nas tradições humanas e nos princípios elementares deste mundo, e não em Cristo".
Colossenses 2:8 (NVI) 

[acréscimo de 2015] Este artigo fora escrito em 15 de Abril de 2010, na época fora publicado em outras mídias institucionais. Contudo, passados mais de cinco anos (2015) e por perceber que o referido texto ainda consegue ser contemporâneo frente aos desafios da cristandade tupiniquim, então, optei em (re)posta-lo, na integra, no BLOG (seabravinicius.blogspot.com.br – criado em 2013), mesmo com o evidente distanciamento dos eventos citados no artigo. Abaixo o texto no original (2010), como se segue:

O Império Romano foi um dos mais notáveis governos que o mundo já conheceu. Entre os diversos feitos, notáveis e deploráveis, há um em especial que fez de Roma um referencial no que tange a relação povo-poder, foi a famosíssima e controversa política social denominada de “panem et circenses, isto é, Pão e Circo. Basicamente a proposta era distrair as massas com os espetáculos sangrentos dos gladiadores e simultaneamente distribuir pão para os presentes nas arenas de Roma. Tal política não seria tão maquiavélica se de fato não encobrisse os problemas de Império em crise. A política do Pão e Circo surgiu quando o imperador percebeu que estava havendo uma migração dos camponeses para o centro urbano, porém não havia condições adequadas para atender as necessidades básicas desta tão grande massa, o que poderia ocasionar revoltas, reivindicações e rebeliões por todo o Império. Então, para encobrir tamanha incapacidade resolveu-se distrair a multidão (luta dos gladiadores) e aplicar medidas paliativas (distribuição de pão). Desta maneira o povo esquecia que viviam num Império em decadência e as massas ovacionavam os desonestos imperadores.

Deste os tempos de Roma até a contemporaneidade a política social do Pão e Circo nunca mais deixou de ser praticado pelos governos – afinal, é uma estratégia eficaz aos interesses dos poderosos, pois encanta o povo, desvia o foco das reais necessidades das massas e ofusca a calamidade existencial. Entretanto, mui estranho e, demasiadamente assombroso, foi perceber que a religiosidade neopentecostal brasileira está valendo desta artimanha para fascinar as massas evangelicais. O Pão e Circo Evangélico é mais maléfico que o praticado por Roma, pois os “imperadores evangélicos”, a semelhança dos fariseus bíblicos, estão conduzindo as pessoas há um cristianismo raquítico e artificial – “Mas ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! pois que fechais aos homens o reino dos céus; e nem vós entrais nem deixais entrar aos que estão entrando” – Mt. 23:13. Portanto, como completa Philip Yancey: “A igreja existe, não para oferecer entreterimento, encorajar vulnerabilidade, melhorar a auto-estima ou facilitar amizades, mas para adorar a Deus. Se falharmos nisso, a igreja fracassa”[1].

O cenário evangélico brasileiro tem sido marcado pelo suposto crescimento das igrejas e pelos constantes mega shows gospel. Há um em especial que merece destaque nas linhas que se seguem: “O Dia D – é hora da Decisão”, que acontecerá no dia 21 de Abril do corrente ano nas principais cidades do Brasil. Para as massas este é mais um mega show para glorificar a Deus, vislumbrar uma série de incontáveis milagres e um oportuno momento para ouvir música gospel de ótima qualidade, de grátis – já que atualmente na maioria dos demais eventos do gênero os preços de ingressos são altíssimos. Tudo isto é muito fascinante, imponente e espirituoso. Contudo, ao contrário daqueles que vão se juntar a multidão no “Coliseu da Fé” no dia 21 Abril, há alguns cristãos pensantes que não são facilmente encantados pela grandiosidade. Este será um típico Pão e Circo Evangélico, haverá luta entre homens e demônios, muita euforia musical e alimento “espiritual” para aqueles que se satisfaz com qualquer coisa.

O dia 21 de Abril será um Pão e Circo Evangélico pelas seguintes razões: 1) Quem está organizando o evento é Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), instituição que na pessoa de seu líder e outros bispos estão sendo alvo de diversas investigações criminosas – então, o “Dia D” é uma ótima oportunidade para conseguir aliados contra a TV Globo e afirmar que tudo que está acontecendo é fruto de perseguição aos evangélicos; 2) A IURD sempre foi mal vista pela cristandade brasileira devido a liturgia nada convencional e pelas técnicas abusivas de coleta de dinheiro – então, o “Dia D” é uma excelente oportunidade para tornar as heresias mais comum ao povo, o que culminará gradativamente num sentimento de aceitação; 3) A IURD nunca foi uma igreja que primasse pela Palavra, sempre foi conhecida pelos milagres, porém nos últimos anos tem perdido este filão de mercado para outra igreja que é idêntica, a Igreja Mundial no Poder de Deus – então, o “Dia D” é uma grandiosa oportunidade para reconquistar a paixão dos crentes cambaleantes que foram hipnotizando pela Igreja Mundial e outra vez igualmente resumir a fé em milagres.

Há mais algumas razões que não podem ficar camufladas: 4) A IURD com este evento nacional está tentando desviar o foco das acusações e processos criminais entretendo o povo – então, o “Dia D” é uma oportunidade ímpar para fascinar com a grandeza do evento as cegas massas evangélicas brasileiras; 5) A IURD sabe que infelizmente as massas evangelicais respeitam uma igreja não pelo caráter cristão mais sim pelo sucesso de público (numerolatria) – então, o “Dia D” é a oportunidade perfeita para reunir centenas de milhares de pessoas e assim mostrar para a mídia que a IURD é forte, paralelamente mostrar para os pastores de outros ministérios que é mais inteligente se juntar a eles que se oporem; 6) A IURD sabe que há muitos líderes que fazem qualquer coisa para aumentar o rebanho – então, o “Dia D” é uma ótima oportunidade para, disfarçado de manifestação cristã de unidade, conseguir alguns membros para as igrejinhas locais, assim os líderes destes ministérios serão eternamente cúmplice deste Pão e Circo Evangélico; e, 7) A IURD não está fazendo este evento para promover a evangelização, pois a divulgação tem sido numa linguagem tipicamente evangélica, com “artistas” evangélicos – então, o “Dia D” é uma oportunidade para bradar em alto som a adoração extravagante, declarar no reino espiritual e fazer inúmeros atos proféticos positivistas, afinal é disto que o povo crente gosta.

Enfim, definitivamente o Brasil é a Roma dos Evangélicos. Somente em terras tupiniquins o “Coliseu da Fé” reacende suas chamas e outra vez se torna o centro da vida religiosa das massas. Ali, debaixo da euforia do povo acontece a morte da razão, o suicídio do bom senso e o exaltação dos imperadores. Na arena deste vergonhoso Pão e Circo se esconde a igreja brasileira que finge não ser doente espiritualmente, fraca socialmente, despreparada teologicamente e imatura biblicamente. Por tudo isto o dia 21 de Abril será de fato o “dia D – é hora da Decisão” – Decisão de não participar deste pelourinho evangélico; Decisão de não ir para esta arena circense; Decisão de não se juntar a estes gladiadores da fé; Decisão de não celebrar estes imperadores eclesiásticos; Decisão de não aplaudir a morte do cristianismo. Por fim é valido endossar as palavras de Ricardo Gondim: “Aconselho que os crentes parem de consumir produtos evangélicos por um tempo. Não compre Cd de música ou de pregação - inclusive os meus. Deixe os livros evangélicos encalharem nas prateleiras - idem, para os meus. Depois que baixar a poeira do prejuízo, ficará notória a diferença entre os que fazem missão e os que só negociam. Não vá a congressos - inclusive o que eu promovo. Passe ao largo dos ‘louvorzões’...”[2].

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 15 de Abril de 2010



[1] Philip YANCEY, Igreja, Por Que me Importar?, p. 25.
[2] Perícope retirada do artigo de autoria do Ricardo Gondim, intitulado: “CONSELHOS PARA SOBREVIVER AO MUNDO GOSPEL”, disponível no site: www.ricardogondim.com.br

segunda-feira, 22 de junho de 2015

De braços bem abertos


"Tudo isso provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo (...) Por amor a Cristo lhes suplicamos: Reconciliem-se com Deus. Deus tornou pecado por nós aquele que não tinha pecado, para que nele nos tornássemos justiça de Deus".
2 Coríntios 5:18,20,21 (NVI) 

De longe se vê o madeiro sendo erguido, sorrisos e choros se confundem em meio à multidão. A cada passo rumo ao Gólgota mais pessoas se aproximam, talvez alguns nem sabiam o que estava realmente acontecendo apenas queriam participar do movimento. Todavia, como pelourinho de vergonha e dor um homem, chamado Jesus, é encravado na cruz. Erguido como troféu, lá em cima, o Nazareno de braços abertos insiste em olhar para baixo. A dor dos cravos, a angústia da sede, o desespero da dificuldade de respirar não eram mais severos que a triste cena dos olhos do Carpinteiro percorrendo a imensa multidão em busca dos Seus discípulos.

Jesus queria encontrar Seus discípulos em meio à multidão não para que eles o tirarem da cruz, pois se Ele quisesse o faria sem ajuda de ninguém. Entretanto, Cristo queria olhar nos olhos dos Seus companheiros de ministério e fazê-los entender que mesmo quando O abandonaram, negaram ou fugiram, ainda sim, Ele estaria lá, simplesmente de braços abertos. Uma pergunta percorria a multidão: onde estavam os discípulos daquele homem de braços abertos? Judas não agüentou a dor de ter que admitir que mesmo na cruz ainda o Mestre estivesse de braços abertos. Pedro não tolerou o constrangimento de perceber que seu Mestre ainda estaria de braços abertos, mesmo tendo ele O negado. Os demais discípulos não puderam admitir a possibilidade de contemplarem, acima de tudo e de todos, que o Carpinteiro, ainda sim, estaria lá de braços bem abertos.

Não eram apenas os discípulos que precisavam ver Jesus de braços bem abertos, quem mais precisava contemplar esta cena era a multidão, pois era exatamente aquela multidão que outrora seguia Jesus para se alimentarem, serem curados, libertos ou para se rejubilarem perante os milagres, são os que agora estava lá embaixo, aos pés da cruz, aguardando apenas o Carpinteiro morrer para voltarem para suas atividades cotidianas e continuar a viver com outrora faziam. No entanto, lá de cima, ainda com os braços abertos, estava Cristo Jesus orando: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem...” – Lc. 23:34. Lá em cima, longe dos gritos da multidão, dois ladrões iniciam um diálogo com Jesus. Um zombou do fato de Cristo ainda estar de braços abertos. O outro preferiu simplesmente se lançar nos braços do Mestre que ainda insistiam em permanecer bem abertos.

A cena da crucificação certamente ficou gravada na mente e no coração de todos os presentes e ficará na memória de todos que conhecem esta história. Indubitavelmente, sempre que as pessoas olharem para a cruz se lembrará de um homem que não foi apenas pendurado no madeiro, mas contemplarão um Carpinteiro que ainda hoje insiste em estar de braços bem abertos, quer seja para os discípulos, ou para mais um na multidão, ou mesmo para um ladrão. Uma certeza há, Ele sempre estará de braços bem abertos, e é por esta razão que Paulo exclamou: “...o amor de Cristo nos constrange...” – 2 Co. 5:14. Por isto, a todos que contemplam a cruz de Cristo só há uma opção de vida: é igualmente abrir os braços e se entregar para Aquele que ainda insiste em estar de braços bem abertos.

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 12 de Junho de 2006