segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Onde moram os sonhos


“Quando o Senhor trouxe os cativos de volta a Sião, foi como um sonho. Então a nossa boca encheu-se de riso, e a nossa língua de cantos de alegria...”.
Salmos 126:1-2 (NVI)

A vida precisa ser vivida em constantes feedback’s para que não nos esqueçamos de onde viemos para depois não lamentarmos onde estamos e nem tão pouco culparmos outros pelo que nos tornamos. Para tanto, trago a memória quando ainda era criança, estava cursando as fases primarias da escola, eram tempos de descobertas, ao mesmo tempo era a época de se pensar ou pelo menos mentalizar o que se esperava da vida e como iríamos passar pela vida. Não era muito difícil encontrar um professor (“tio” e “tia”, como se dizia naquela época) que constantemente nos passava uma folha em branco e pedia para a classe desenhar o que queríamos ser quando crescêssemos.

O simples pedido para pintarmos nosso futuro era algo empolgante. Alguns pintavam uma cruz vermelha e ambulâncias, simbolizando que queriam trabalhar na área de saúde, desejavam salvar vidas da morte, ser a esperança de vida para muitos. Outros rascunhavam um policial, tendo em vista cuidar da segurança das pessoas, visavam ter assim um mundo mais seguro para se poder viver em liberdade. Havia ainda muitos que ilustravam pessoas que cuidavam de animais e/ou da natureza, ambos vislumbravam um mundo com equilíbrio ecológico e respeito ambientalista. Era comum achar desenhos de pessoas que queriam ser pilotos, atletas e outras atividades que intentavam representar a nação, ali havia patriotismo, acreditavam na nação.

Hoje quando me lembro dos desenhos de quando era criança não me recordo de outra coisa a não ser que cada um tinha a capacidade de sonhar. Queríamos ser úteis quando crescêssemos, transformar a sociedade, promover revoluções, salvar vidas, fazer justiça social e ecológica. Tudo parecia muito possível, por mais distante que se parecesse o sonho, ainda sim, sentíamos como se fosse apenas uma questão de tempo. Nas brincadeiras, nas rodas de amigos, na família, nas orações ou em qualquer lugar falávamos abertamente desde futuro transformador. Um detalhe tem de ser pontuado, não me recordo de nenhum desenho que não tivesse um cunho comunitário. Nossos sonhos eram para beneficiar outros, nos sentíamos completos em sonhar que um dia seriamos úteis para outras pessoas. Queríamos escrever a história, não somente passar por ela.

Os anos se passaram e a vida é uma caixinha de surpresas. Então, por mais que os nossos sonhos fossem nobres foram ficando cada vez mais distantes da realidade. Os sonhos idealistas foram se tornando em um pesadelo realista. Cada vez menos interesse pelas causas sociais, justificando falta de tempo. Cada vez menos interesse em salvar vidas, pois afinal tudo era mera utopia infantil. Cada vez menos coragem para fazer revoluções, pois se prefere uma paz egoísta do que se juntar aos que gritam. Cada vez menos vida, pois afinal das contas o que se quer é apenas sobreviver. Os lindos e empolgantes desenhos de outrora ficaram, propositalmente, no esquecimento. Momentos saudosistas, vidas insignificantes, sonhos abandonados, ideologias medíocres e milhares de vidas a espera de um milagre. Infelizmente, o sonho de muitas pessoas “crescidas” é simplesmente tentar acreditar que ainda podem sonhar como faziam quando eram “crianças”. Afinal, o que parece é que quando somos adultos agimos de forma infantil.

Por tudo isto, seria razoável ponderar que o que realmente importa nesta vida não o quanto já vivemos, nem quantos títulos conseguimos, muito menos quantos aplausos nos precederam, mas sim o quanto fomos fieis aos sonhos que Deus colocou em nossos corações ainda quando pensávamos ser “crianças”. Portanto, há uma verdade que irá nos assombrar por toda vida, a dura certeza de que hoje somos conhecidos pelo que sonhamos, amanhã seremos referenciados pelo que fizemos, em um futuro bem próximo seremos lembrados tão somente pelo que fizemos com nossos sonhos.

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 02 de Dezembro de 2006

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

As migalhas do Reino


“O que as suas mãos tiverem que fazer, que o façam com toda a sua força (...) Maldito o que faz com negligência o trabalho do Senhor!”
Eclesiastes 9:10 (NVI) e Jeremias 48:10 (NVI) 

Há várias maneiras de se ausentar do serviço a Deus, o mais usual em solos tupiniquins é desmoralizar a igreja criando uma forma individual de servir a Deus, desassociada de qualquer interação grupal. É fato que há muitas falhas e debilidades na igreja brasileira. É óbvio que fazer parte de uma igreja inclui a certeza axiomática de encontrar fofocas, conflitos e desconfortos. A igreja sempre será um lugar de gente deformada – a igreja existe para isto, expor nossa corruptibilidade humana. Contudo, fugir por vias de uma religiosidade particular (leia-se individualista) que não inclui o suportar uns aos outros, que não se assemelha com o amar de forma relacional-intencional e que não comunga da imprevisibilidade comunitária, desnuda, então, uma religiosidade maquiada, pois não tem implicações sociais (grupal).

A espiritualidade individualista não tem relevância, pois o próprio Cristo se fez carne para sociabilizar com os Seus mostrando que religião e gente andam juntas, de forma indissociável. Contudo, distante destes que privatizam o Reino em masmorras particulares com fins a fugir do compromisso integral em servir mutuamente, há outro tipo de pessoas que passam quase despercebidos no serviço a Deus, são aqueles que dão migalhas ao Reino. Estes são piores do que aqueles que inventam uma religiosidade individualista, pois estes da turma da migalha preferem intencionalmente fingir que estão servindo a Deus – aparentam estarem dedicando tempo e vida em prol do reino, mas na verdade não estão.

Os que dão migalhas ao Reino são aqueles que poderiam fazer muito mais do que tem sido feito, porém preferem fazer pouco para não cair no ativismo – se esquecem que ativismo não é fazer muito, mas sim fazer muito sem propósito; são aqueles que poderiam ajudar mais, porém preferem se calar para nada ter que fazer, assim ninguém tem o que cobrar e, então, desfrutam de uma paz – se esquecem que paz não é fruto de ausências, mas sim resultado da presença; são aqueles que tem competência para oferecer um serviço de qualidade, porém preferem emporcalhar e improvisar o que tem a ser feito sob o argumento de que Deus vê é o coração – se esquecem que o fato de Deus vê o coração não se refere apenas a aspectos internos, mas sim as intenções que remetem a exterioridade.

Os da turma da migalha são aqueles que quando vão fazer algo secularmente o fazem com todo esmero possível, porém quando vão fazer algo na igreja o fazem raquiticamente com a pretensão de que o Reino carece de simplicidade – se esquecem que simplicidade nada tem haver com relaxos, mas sim com espontaneidade. São aqueles que não acham desnecessário gastar dinheiro com comida, roupas, viagens ou outras coisas de entretenimento pessoal, porém se limitam a ajudar a irmandade eclesial ou a algum necessitado qualquer sob a egoísta argumentação de que Deus me abençoou com o meu salário por causa da minha fidelidade a Ele, então, o dinheiro deve ser usado para minha satisfação, afinal, Deus quer a minha felicidade – se esquecem que felicidade não é um aditivo por se viver bem, mas sim o distintivo daqueles que escolhem substituir o eu ser feliz por nós sermos felizes.

Enfim, o caminho não é criar uma religiosidade individualística que mutila o Cristianismo, muito menos ingressar no rol dos da turma da migalha que parecem estar servindo a Deus. O convite do Carpinteiro é que possamos descobrir o prazer de fazer a Deus o melhor, com todas as nossas forças, com todo nosso coração, com todos nossos recursos, com todas nossas qualificações, com tudo que temos e com todas nossas intenções. E assim, não oferecer migalhas ao Maestro, pois a bem da verdade se temos vida é por causa dEle, se temos tempo é para ser usado para Ele, se temos recursos é para ser disposto no Reino, se existimos é para cumprir os propósitos dEle e se ainda estamos aqui é porque Ele sabe que podemos ser mais do que estamos sendo.

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 15 de Janeiro de 2014

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Dois erros que você já cometeu em 2014


“então percebi tudo o que Deus tem feito. Ninguém é capaz de entender o que se faz debaixo do sol. Por mais que se esforce para descobrir o sentido das coisas, o homem não o encontrará. O sábio pode até afirmar que entende, mas, na realidade não o consegue encontrar”.
Eclesiastes 8:17 (NVI) 

Um novo ano começa (2014), e apesar dos poucos dias vividos deste dito novo tempo, percebe-se que aquelas coisas velhas ainda estão vivas, mesmo com toda euforia cantante de “Hoje é um novo dia, de um novo tempo que começou. Nesses novos dias, as alegrias serão de todos, é só querer. Todos os nossos sonhos serão verdade, o futuro já começou...” (música de Marcos Valle, tema dos finais de ano da Rede Globo). Contrariando a magia dos cantantes jubilosos triunfalistas a International Stress Management Association (Isma) no Brasil publicou um pesquisa em janeiro de 2008 (comentários sobre pesquisa disponível no site da UOL) afirmando que “apenas 19% das pessoas cumprem suas resoluções de Ano Novo. Cerca de 30% desistem na primeira semana e o resto, em um mês”. Então, nesta insólida realidade contemporânea, como propõem o sociólogo Zygmunt Bauman, os tempos pós-modernos sofrem um estado de deformação ao ponto de transformar-se de sólido em líquido, criando assim um mundo instável e de curto prazo. Sendo, portanto, inevitável que todos nós já tenhamos cometidos pelos menos dois erros clássicos neste novel ano de 2014.

O mais cotado dos erros que provavelmente tenhamos cometido neste início de ano é o fantasioso planejamento. As igrejas nos finais e início de cada ano inventam o tal de “projetando 2014” como uma estratégia, supostamente, para alinhar os planos humanos com o Divino. Entretanto, precisamos arrazoar sobre algumas inquietudes. Por exemplo, nestes dias de “projetando 2014” as pessoas afirmam que vão buscar orientação de Deus, porém o que se percebe é uma romaria protestante para determinar no reino espiritual o que se quer para o ano novo. É como se Deus fosse refém de nossos desejos, e a prova disto é que insistimos pela oração que Deus atenda o que projetamos, ou seja, é Ele quem deve se adequar aos nossos projetos. Esquecemo-nos que Deus “não é domesticável”, como propõem C. S. Lewis referindo-se a Aslam em “Crônicas de Nárnia”. Por esta razão, O Criador contraria nossos orgulhosos planejamentos e leva-nos a outra direção. Ele não está preocupado com o que projetamos, mas sim se estamos dispostos a obedece-lO, mesmo que isto nos custe rasgar o fichamento do “projetando 2014”. Precisamos aprender a dar um passo de cada vez, o Maestro não é muito de relevar o futuro.

Outro clássico erro que invariavelmente já cometemos em 2014 é pecarmos. Diferente da esperançosa expectativa de Réveillon que inclui mudanças gigantescas, abandonar a pecaminosidade diária, santificação absoluta e tantas outras promessas que se assemelham a um convite de “Alice no País das Maravilhas” ou algo tipo “Terra do Nunca”, temos que ser sinceros, aquele pecado de estimação amanheceu no dia 1° de janeiro juntamente conosco. Precisamos reconhecer que nunca deixaremos de pecar, por mais espiritual que seja nossas intenções. O pecado sempre vai estar à porta (referência à advertência de Deus a Caim antes de assassinar Abel, Gn. 4:7). O pecado é um dispositivo importantíssimo na nossa jornada cristã, pois sempre que pecamos nos humilhamos, pedimos perdão, reconhecemos a necessidade do sacrífico vicário de Cristo, admitimos nossa incapacidade de sermos santos por nós mesmos, vislumbramos a Graça. Portanto, Deus não vai nos dar um ano sem pecados, mas vai oportunizar, sempre que pecarmos, o caminho para encontramos a justiça/amor que emana da Cruz.

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 07 de Janeiro de 2014