terça-feira, 5 de agosto de 2014

Aos que reconhecem a própria dor


“Disse o Senhor: De fato tenho visto a opressão sobre o meu povo no Egito, e também tenho escutado o seu clamor, por causa dos seus feitores, e sei quanto eles estão sofrendo”.
Êxodo 3:7 (NVI)

Há uma frase que comumente é atribuída a William Shakespeare, em que afirma: “todo mundo é capaz de dominar a dor, exceto quem a sente”. Sendo assim, há dores que insistem em nos perseguir por anos a fio, outras tantas parece transporem a linha temporal da vida. Discursar acerca da dor do outro não faz sentido, pois não é sentido (trocadilho linguístico proposital). Dor, tristeza, angustia, decepção, frustração, silêncio, sofrimento, e outros desafortunados distintivos assolam a humanidade desde os primórdios. Estranhamente, a igreja fez destas desventuras algo demoníaco, o que só favorece a desilusão e a desesperança daqueles que tem suas histórias manchadas por vazios. Não precisamos ter respostas para tudo, nem carece de transferir responsabilidades aos seres espirituais, tentando dar explicações simplistas a cousas complexas, tipo clichês igrejeiros. O que precisamos é aprender a escutar o agir silencioso do Carpinteiro.

“Todo mundo é capaz de dominar a dor, exceto quem a sente”, disto o sabe mui bem a mãe que sofreu um aborto espontâneo, perdendo seu filho(a) ainda informe no ventre. Esta, agora, entende que para amar não precisa conviver muito tempo com, não há necessidade de conhecer muito sobre, não carece de grandes momentos para, esta desafortunada, enfim, descobre que amar é um dom que aflige os que são tomados de tamanha virtude. Esta foi mãe, mesmo nunca tendo visto seu filho(a), e ser mãe não se conjuga com o estado passado, ou seja, é impossível ser ex-mãe. E está é uma dor que torna-se indivisível consigo mesma. A única, e suficiente alegria, que pode sobrepor tamanho vazio é a certeza axiomática de que pelos breves dias de existência, ainda no ventre materno, este pequeno ser, desfrutou da maior grandeza dada aos mortais, ser desenhado de forma admirável pelo o Autor da Vida, e saber então que: “os teus olhos viram o meu embrião; todos os dias determinados para mim foram escritos no teu livro antes de qualquer deles existir” – Sl. 139:16 (NVI).

“Todo mundo é capaz de dominar a dor, exceto quem a sente”, disto o sabe mui bem aqueles pais que tem que enterrar seus filhos. A lógica da vida é que filhos enterrem pais, não o contrário. Para estes a dor da perda soa como a interrupção de uma jornada com infindáveis possibilidades, que agora não passam de tristes lembranças do que se perdeu. Tristeza que assola os rincões mais distantes dentro do coração. Para estes pais, órfãos de filhos, a morte não é mais um tragédia absurda, mas sim um encontro desejável, crendo que além dos limiares da vida poderão reencontrar com a prole que se foi e, então, novamente abraçar, acariciar, conversar, debruçar, afagar, completando-os novamente em suas histórias eternas. O consolo para os tais parte do pressuposto que Deus (Pai) sabe o que é amar um Filho (Jesus), e então: “que o próprio Senhor Jesus Cristo e Deus nosso Pai, que nos amou e nos deu eterna consolação e boa esperança pela graça, dê ânimo aos seus corações e os fortaleça...” - 2 Ts. 2:16-17 (NVI).

“Todo mundo é capaz de dominar a dor, exceto quem a sente”, disto o sabe mui bem aqueles que foram assombrados pelo desaparecimento de um(a) filho(a). Diferente do caso exposto no parágrafo anterior, agora estes convivem com a perturbadora dúvida da vida ou morte. Para estes as noites nunca mais significarão descanso, jamais serão de sonhos, não mais será possível sorrir como outrora. O desaparecimento de um ente querido não encerra a história, apenas a torna suspensa. Sendo assim a história subsequente não mais tem continuidade, tudo perde o valor. Nada mais tem significado real. A dor de não saber o que aconteceu (ou o que está acontecendo) é extremamente sufocante. Esta é a dor da impotência do que somos. Não longe dai, deste lugar de desconsolo pleno, ouve-se o sussurro do Carpinteiro que insiste: “venham a mim, todos os que estão cansados e sobrecarregados, e eu lhes darei descanso. (...) vocês encontrarão descanso para as suas almas” – Mt. 11:28-29 (NVI).

“Todo mundo é capaz de dominar a dor, exceto quem a sente”, disto nós, agora, sabemos muito bem, pois sentimos dor.

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 05 de Agosto de 2014

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