“Pastoreiem o rebanho de
Deus que está aos seus cuidados. Olhem por ele, não por obrigação, mas de livre
vontade, como Deus quer. Não façam isso por ganância, mas com o desejo de
servir. Não ajam como dominadores dos que lhes foram confiados, mas como
exemplos para o rebanho”.
1 Pedro 5:2-3 (NVI)
Ser pastor para
muitos aventureiros gospeis resume-se
a fazer um show dominical, e nada mais. Converge todo o ministério pastoral
numa festiva seção religiosa coletiva que estranhamente pouco tem de envolvimento.
São pastores de auditórios. Que de longe discursam sobre seus triunfalismos,
que quase sempre são recheados de testemunhos pessoais próprios, como se suas
vidas pastoris fossem a base para a fé dos ouvintes. Fazem da religião uma
panaceia neurótica desprovida de relevância cotidiana. São pastores que não são
pastores, mas sim animadores de palco, gerentes eclesiásticos e/ou apenas
pastores de títulos (nunca pastorearam efetivamente). Para estes, pastorear é
uma diversão com ares de status
social-religioso, afinal para muitos o pastor é o ungido intocável todo
poderoso.
Longe desta palhaçada
contemporânea que fez do pastor um super-herói da religiosidade moderna existe
os pastores (ordenados ou não) que, intencionalmente, escolheram pastorear “não
por ganância, mas com o desejo de servir. Não como dominadores dos que
lhes foram confiados...” - I Pe. 5:2-3. Entretanto, não sejamos ingênuos, este
não estão imunes às mazelas da vocação pastoral e, então, são atormentados com
a LER pastoral – LER aqui não se
refere ao verbo “ler”, mas sim a Lesão por Esforço Repetitivo (LER) aplicado a
corriqueira rotina pastoral de muitos.
A LER pastoral leva anos para demonstrar sintomas
visíveis, pois afinal, é resultado de ações repetitivas cotidianamente que
aparentemente são inofensivas, mas com o tempo se mostra sobremodo prejudiciais.
E é exatamente sobre estas inofensividades cotidianas repetitivas que
abordaremos neste texto, desnudando como os próprios pastores, a igreja e o sistema
eclesial moderno corroboram para a degeneração dos pastores vocacionados. Automaticamente
fortalecendo o aparecimento dos super-pastores que nunca sofreram da LER pastoral, pois para todos os efeitos
estes não são pastores.
A LER pastoral inicia quando o referido
pastor (insisto, ordenado ou não, ser pastor não tem muito haver com a nomeação,
mas sim com a função prática e a vocação desenvolvida) tem que constantemente
ensinar as mesmas coisas quase que dominicalmente. Repete o mesmo sermão várias
vezes, não com o mesmo texto, nem com os mesmos argumentos, mas sim com a mesma
essência educativa-religiosa proposta, pois parece que os ouvinte não tem mais
capacidade de interiorização das temáticas apresentadas. Repete-se os estudos bíblicos,
pois percebe-se que o que fora exposto não teve relevância (apropriação) para
os fieis. Repete-se, e repete-se os ensinos. Até que o referido pastor cansa de
tentar convencer os ouvintes acerca das verdades bíblicas e dai começa até a
questionar se realmente são “verdades”.
A LER pastoral se dá quando o pastor tem
que ficar mantendo membros na igreja através de visitas sistemáticas aos fieis.
A visitação faz parte do ministério pastoral, contudo, valer-se deste para
manter membros na igreja é um convite à repetição mecanicista e desprovida de efetiva
fraternidade. Repete-se as visitas com freqüência, pois se não visitar os
membros embirram e vão para outra igreja ou “desviam”. Repete-se as visitas,
pois as pessoas precisam ser mimadas para suprir um carência afetiva do nosso
tempo. Repete-se, e repete-se as visitas. Até que o referido pastor cansa de
repetir uma ação que julga ser apenas mecânica e dai começa a distanciar das
pessoas.
A LER pastoral se manifesta quando em toda
reunião de conselho, presbitério, diaconal, ou qualquer outra forma
organizacional de governo eclesiástico, tem-se que ficar a repetir as mesmas orientações
básicas. Quase que não precisa mudar a pauta da reunião: os problemas estruturais
continuam os mesmos, o pessoal do louvor permanece insubmisso, na liderança dos
departamentos sempre tem um líder que precisa ser exortado/corrigido e por ai
vai... Ao que parece os problemas permanecem os mesmos, o que muda é somente o
rosto dos envolvidos. Então, repete-se as reuniões de conselho para tomar as
mesmas decisões que já tinham sido deliberadas. Repete-se as reuniões para
reafirmar o que fora definido na reunião anterior. Repete-se, e repete-se as
reuniões. Até que o referido pastor cansa de repetir as mesmas reuniões chatas/improdutivas
e dai começa a tomar decisões isoladamente ou decide afastar do pastoreio para
não ter que aguentar esta estagnação de maturidade coletiva.
A LER pastoral é real, e afeta os pastores
de forma violenta, ao ponto de alguns
não resistirem a tamanho desgaste intelectual, emocional e físico, não restando
outra opção a não ser abandonar o pastoreio. Este intencional abandono não é
sintoma de fraqueza, mas sim um suspiro de reverência, pois quando os tais
pastores com LER pastoral se olham no
espelho não conseguem ver alguém que esteja contribuindo com o Reino, por isto
preferem sumirem, renegando a si mesmos ao campo da inutilidade. Estes
reconhecem a visibilidade de suas patologias pastorais e não querem bandidar para
o outro extremo se tornando super-pastores de platéias.
A boa notícia é
que se a LER pastoral é provocada por
uma rotina mecanicista que sufoca a essência ministerial, então, podemos
combate-la através de um esforço coletivo (pastores, igreja e sistema). Talvez
se houvesse mais intencionalidade em engajarmos nossas vidas no ministério; Talvez
se nos dispormos a ser ao invés de fazer; Talvez se decidirmos congregar não
esperando receber, mas sim em doarmos parte de nós; Talvez se pastorear não
fosse um distintivo de diferenciação entre os irmãos; Talvez se pararmos de
inventar desculpas; Talvez se começássemos a assumir nossas culpas... talvez...
Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
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Artigo escrito em: 11 de Setembro de 2014
Concordo plenamente!
ResponderExcluirOla, Victor. Obrigado por comentar este post. Que bom sabe que o texto encontrou "eco" em suas vivências.
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