quinta-feira, 20 de junho de 2013

Por uma redemocratização tupiniquim


"Ter escravos não é nada, mas o que se torna intolerável é ter escravos chamando-lhes cidadãos".
Denis Diderot - filósofo e escritor francês (1713-1784)

Democracia já! Os políticos corruptos que financiam a mídia televisiva insistem num discurso de categorizar como “vandalismo” aqueles que desiludidos com a ineficiência do pacifismo (palavra pomposa para movimentos inexpressivos) optaram por medidas radicais e até improprias. Tristemente, a quebradeira se torna a voz daqueles que não mais são ouvidos pela razão, se torna o grito daqueles que se cansaram de argumentar sem sucesso e se torna a bandeira dos que vivem marginalizados comendo das migalhas do capitalismo. Os lideres “pacifistas” insistem em não serem identificados com estes “vândalos”, sem perceber estes estão sendo manipulados pelos telejornais que os fizeram acreditar que se ficarem andando pelas ruas serão ouvidos pelas autoridades brasileiras, mentira, ilusão de marionetes da pseudodemocracia. Sejamos sinceros, a mídia só esta dando tanta atenção aos movimentos populares atuais pelo fato de estar havendo quebradeira, jornalismo hoje se resume em noticiar caos (e ainda de forma tendenciosa), passeatas pacifistas nunca foram destaques no Jornal Nacional – o que os repórteres querem é ver o circo pegar fogo, isto é notícia que aumenta o IBOPE. Os políticos querem assistir pela TV o povo quebrando tudo, pois assim vão conseguir desviar mais verbas públicas para reformas do pós-quebradeira. Há ainda os políticos de oposição (nome dado aos que não sabem criticar e que desejam o poder a qualquer custo) que sempre querem ver tudo ruindo para que nas próximas eleições se apresentem como a solução para um Brasil caótico – e o povo acreditará, sem dúvida. Pacifismo não funciona (inexpressão), vandalismo também não (manipulação), é necessário descobrir um novo modo de democratizar.

Democracia já! Sobre a destruição em massa alguns aspectos precisam ser arrazoados. É lamentável perceber que sem agressão pouco se ganha destaque neste Brasil. Contudo, é valido (re)pensar algumas variáveis desta atitude. Quebrar patrimônio público é favorecer o desvio de verbas governamentais (como exposto no parágrafo anterior), além de destruir parte de nossa história artística, cultural e arquitetônica – isto não é bom. Depredar instituições privadas é promover terrorismo aos cidadãos que ficam a orbitar frente às manifestações, impondo medo aos espectadores que assistem a quebradeira assentados num sofá comendo um Big Mac – isto não favorece o ingresso de novos adeptos a causa, pois por aqui puritanismo barato e moralismo farisaico são como capim em dias chuvosos. Há ainda algo inquietante nesta história, se os tais “manifestantes enfurecidos” estão de fato enraivados com o capitalismo, então, deveriam começar a quebradeira com/em seus patrimônios: depredem suas próprias casas, queimem seus próprios carros, atei fogo em suas próprias roupas, parem de comer em restaurantes, desliguem a televisão, parem de ver o jogo do Brasil, parem de comprar, chega de consumir – ai sim seria um bom manifesto contra o capitalismo – mostrem que é possível (se é que é) viver de forma democrática gastando menos, compartilhando mais, e sociabilizando com os marginalizados. Tentar convencer outros de algo que não se está disposto a incorporar no modo de vida é perca de tempo, e não é nada democrático.

Democracia já! Os governadores e prefeitos das cidades que estão sendo “alvo” das manifestações estão discursando que não vão impedir as passeatas pacíficas, dizem isto como se tal discurso fosse democrático. Lego engano. Democracia não é deixar o povo caminhar pelas ruas, isto é liberdade de expressão. Democracia inclui o diálogo, deixar o povo gritando pelas vias é monólogo, descaso e desinteresse. As manifestações coletivas são provas de que não há democracia, pois se saem nas ruas é porque não foram ouvidos (perceba a conjugação verbal no passado); se precisam fazer passeatas é porque não tiveram condições de dialogar com as autoridades (in)competentes (outras vez o verbo está no passado); se necessitam gritar é porque suas vozes foram ignoradas ou não havia espaço para ouvi-las (novamente o verbo insistem em ficar no passado); se carecem de unir forças para lutar contra a minoria dominante é porque foram rechaçados a condição de escravos do sistema sem ter condições de se defenderem (ainda sim o verbo se enamora com o passado). Perceba então que democracia não é deixar o povo manifestar, pelo contrário, isto denuncia nosso frágil sistema opressor rotulado de democrático. Os políticos instem em afirmar que manifestações são normais em países com governo democrático. Mas, isto também não é verdade. Os países que mais tem manifestações públicas são exatamente os que não têm democracia (e.g. vários países no oriente-médio e algumas ditaduras disfarçadas na América Latina). Enfim, o povo faz manifestações para lutar por democracia – se precisa lutar por, quer dizer que não a tem.

Democracia já! Precisamos rever se o Brasil de fato vive num contexto democrático. Se em solos tupiniquins realmente existisse democracia então algumas coisas deveriam ser bem diferentes, segue algumas sugestões: As eleições não deveriam ser obrigatórias, pois se vivo numa democracia tenho que ter o direito de escolher votar ou não, qualquer imposição unilateral está por definição longe do estado democrático. Outra sugestão bem democrática seria que as eleições não fossem por voto secreto, onde o cidadão pudesse livremente expor em quem votou sem medo de retaliações, repreensões ou represarias de outrem. Com o voto aberto (não secreto) o político eleito teria sua candidatura atrelada aos seus eleitores que poderiam a qualquer tempo retirar-lhe o voto, favorecendo a perda do mandato – teríamos um site atrelado aos Tribunais Eleitorais que exporiam numa página da internet quem e quantos votaram, o eleitor que se arrependesse do voto ou mudasse de opinião por insatisfação faria um ofício que protocolaria ao órgão competente retirando assim o seu voto, então, o referido servidor público (político) poderia perder o mandato imediatamente (sem recurso ou fórum privilegiado), isto se o número de eleitores estiver abaixo do estipulado pelo Tribunal Eleitoral. Bom seria se política não pudesse ser carreira, nem profissão, estes devem partir do pressuposto que se está servindo o povo, para o povo, sendo do povo. A República seria uma grande ONG que não pode ter sua diretoria remunerada (como é lei para qualquer ONG – serviço de utilidade pública/social), pois caso contrário haverá conflito de interesses e possível corrupção – algo do tipo que vemos todos os dias no cenário político brasileiro. No dia que ser político não der dinheiro, boa parte dos lobos vai sumir (ou pelo menos vão mudar de matilha).

Democracia já! Finalizo esta pensata democrática pinçando algumas insanidades em meu imaginário apolítico. Imagine... se todos estes manifestantes fosse para Brasília pedir o Impeachment dos políticos (presidente, governadores e prefeitos) – por muito menos e com muito menos pessoas conseguimos tirar Fernando Collor de Mello em 1992); ...se toda esta massa humana fosse escutada e conseguíssemos estabelecer plebiscitos para que o povo escolha, discuta e critique alterações na Constituição, na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), entre outras leis – se isto não é possível pela atual legislatura brasileira, então, que se desconstrua as presentes bases legais e restabeleça a lei a partir do povo; ...se todos este vândalos (como estão sendo chamados) fossem nas indústrias multinacionais e fomentassem a nacionalização, valorização do regionalismo e o trabalho justo – a bem da verdade o Estado está rendido aos pés das empresas privadas, o grande vilão são estes multimilionários que usam a máquina governamental para fazerem suas empresas crescerem e enriquecerem acentuando a desigualdade social; ...se toda esta gente aprendesse a se auto-criticar, auto-disciplinar, auto-avaliar e auto-pensar – quem sabe assim poderíamos ter um país que não apenas julga como corrupto o desvio de verbas governamentais, mas igualmente sentiríamos revolta e desprezo para com nossas corrupções civis/cotidianas como atravessar uma cerca para “pegar” (roubar) melancia numa plantação à beira de estrada, ou, como pegar nota fiscal no “valor mais alto” (superfaturar) do que o real num posto de combustível ou no restaurante para repassar para a empresa. Enfim, é necessário descobrir um novo modo de democratizar. Precisamos de uma redemocratização tupiniquim, antes que nos acostumemos com manifestações populares e nos esqueçamos da democracia.

Democracia já! 

Fortalecido pela cruz de Cristo,
Vinicius Seabra | vinicius@mtn.org.br

Artigo escrito em: 18 de Junho de 2013

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